Foto ampliada 3000x da alga que pode devolver
a visão a cegos. (Foto: Wikimedia Commons)
Uma alga que vive no meio da água e da sujeira pode ser responsável por devolver aos cegos a capacidade de enxergar. A Chlamydomonas reinhardtii tem uma estrutura simples, é unicelular, possui duas caudas parecidas com chicotes circundando seu corpo e ainda uma estrutura parecida com um olho, que nem chega a ser um olho de fato, que ela usa para encontrar luz e, assim, realizar a fotossíntese.
Apesar da simplicidade, esse organismo vem sendo apontado como possível responsável pela cura da cegueira. Isto porque, assim como acontece em um olho humano, a estrutura que a alga utiliza para "enxergar" faz uso de proteínas fotossensíveis. Entre elas, uma em especial chama a atenção: a canal-rodopsina-2 (ChR2). Transplantada para um olho humano, ela poderia devolver a ele a capacidade de enxergar novamente.
A ChR2 já funciona
Algo que anima os cientistas e também aqueles que desejam ter a cegueira curada é o fato da proteína canal-rodopsina-2 já ter sido utilizada com sucesso em pesquisas semelhantes. Atualmente, neurocientistas empregam a ChR2 em células cerebrais para tornar neurônios sensíveis à luz — um processo chamado de optogenética.
A proteína foi usada em laboratório para implantar memórias falsas em ratos e teve as suas características de fotossensibilidade estimuladas por meio do uso de fibras ópticas. O resultado foi que os pequenos animais demonstraram ter lembranças de algo que não haviam vivido de fato, criando um resultado semelhante ao do filme “A Origem”, de Christopher Nolan.
Pesquisa em evolução
As pesquisas e testes realizados pela RetroSense foram licenciadas por Zhuo-Hua Pan, um pesquisador especializado em olhos da Universidade Estadual de Wayne. Ele estuda como restaurar a visão depois que cones e bastonetes morreram, que é o que acontece em pessoas com retinite pigmentosa.
Quando se pensa em doenças genéticas de humanos, o óbvio é imaginar a utilização de outros genes humanos para tentar curá-las. Entretanto, proteínas humanas são muito sensíveis, demandando a implementação conjunta com outras diversas proteínas. Assim, os cientistas teriam que inserir um conjunto de genes dentro de um ser humano, algo visto como quase impossível pelos pesquisadores.
A partir daí, em 2003, Pan divulgou um artigo científico no qual indicava o uso das proteínas canal-rodopsina-2 retiradas de algas Chlamydomonas reinhardtii. Com a necessidade de usar uma proteína e um gene, as características da ChR2 se mostraram ideais e os cientistas começaram a inseri-las em células de mamíferos.
“Funcionou perfeitamente, mesmo no começo”, revelou Pan à revista Wired. “Era, basicamente, muita, muita sorte”, complementa o especialista.
Testes em humanos devem começar em breve
Recentemente, o órgão do governo dos Estados Unidos que regulamenta a produção e venda de remédios e alimentos, a Foods and Drugs Administrarion (FDA, uma espécie de Anvisa de lá), autorizou a RetroSense a iniciar os primeiros testes da nova técnica em seres humanos.
A empresa planeja recrutar 15 pacientes cegos acometidos da doença ocular genética retinite pigmentosa. Ela causa a degeneração da retina e quem a tem vai perdendo a visão de forma gradual — ou seja, pelo menos por enquanto, cegos de nascença não serão cobaias do experimento. De acordo com a RetroSense, os testes devem começar já no último trimestre de 2015.
Assim como os cientistas que fizeram os neurônios de ratos sensíveis à luz, os pesquisadores da RetroSense também vão implantar a ChR2 nos neurônios retinianos para torná-los fotossensíveis. A diferença está no meio de transporte da proteína: aqui, eles usarão um vírus em vez de fibra óptica.
A ideia de utilizar vírus em tratamentos genéticos para curar doenças genéticas não é exatamente novidade. Isso já foi tentado inúmeras vezes, com estes organismos servindo de veículo para carregar genes saudáveis até o local da doença. A diferença aqui é que o gene em questão não vem de outro ser humano, mas sim de uma alga.
Indo direto ao ponto
O olho é uma estrutura bastante complexa e confusa, repleto de camadas e microrganismos. Assim, a RetroSense mira apenas a última camada dos neurônios retinianos, chamados de células ganglionares da retina. Pela lógica, torná-los fotossensíveis pode superar as camadas anteriores danificadas pela doença e corrigir o problema da cegueira.
O resultado esperado não é, logo de cara, uma visão 100% plena e funcional. Os ratos de laboratório nos quais este método foi testado aparentemente enxergavam feixes de luz. Algo assim é esperado nos humanos que servirem de cobaia, ao menos em um primeiro momento.
O fato é que a optogenética está caminhando firme rumo à sua implementação em seres humanos. Depois de mais de 15 anos de pesquisa, em breve teremos as primeiras respostas de pessoas que tiveram ChR2 implementadas em suas retinas. A torcida é para que os resultados sejam positivos.
Fonte: Wired
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